QUEM ME BEIJOU?

Sue Clark

Hoje começa a enxurrada de entrevistas, pré-entrevistas de seleção. Ou seja, eu e mais alguns produtores do programa, teremos que passar por vários programas, para responder às mesmas perguntas sobre o nosso reality, e apresentar os nomes dos futuros promissores participantes. Melhor dizendo, eles tentam fazer com que nós revelemos os nomes, mesmo sabendo que nós não podemos revelar, nem mesmo um nome em cotação e, nós não revelamos!

 — Ah! Só um nome, vai? — diz Anne, apresentadora da seção de entrevistas do Jornal da Manhã de Nova York, em nossa emissora regional.

  — Você sabe que não podemos, querida. — Lisy responde com uma risadinha simpática. — Só podemos dizer que já estão confinados! — ela se vira para a câmera. — Meninas! Comecem a se candidatar! Eles são gatos ricos! E eles todos são celebridades entre vinte e oito e trinta e cinco anos!

 — Ok... — Anne se dá por vencida. — mas vocês podem, pelo menos, dizer quantos serão selecionados dessa vez?

 — Apenas um! — é minha vez de responder.

Várias perguntas são feitas por Anne, antes de passarmos para o talk show de George. Ele faz algumas perguntas tentando extrair de nós os nomes dos candidatos, e acaba repetindo a pergunta de Anne sobre a quantidade.

 — Mas vocês sempre colocam pelo menos três, Sue! — George parece intrigado por ser apenas um principal. — Por que apenas um nesta edição?

No dia seguinte, no programa de entrevistas de Vince, em nossa emissora local de Chicago, repito a resposta de “Por que apenas um?”

 — Nós vamos fazer, três edições diferentes esse ano! — respondo sorrindo. — Mas vamos selecionar todos de uma vez! Tanto o principal, que é o noivo, quanto as candidatas a futuras esposas de celebridades.

As perguntas são basicamente as mesmas, eles às vezes mudam uma palavra, usando sinônimos, parecendo que mandaram o mesmo script para todos os entrevistadores, mas Sally, que comanda as entrevistas no meio do jornal em horário nobre, tem uma pergunta diferente.

 — Deixa-me ver se entendi... vocês vão deixar algumas celebridades em isolamento… por meses? — ela pergunta espantada.

 — Você acha que eles ficariam? — Phill responde com outra pergunta.

Peter, que conduz entrevistas na madrugada em Las Vegas, pega o raciocínio de Sally e faz um gancho, quando Phill repete a pergunta “Você acha que eles ficariam?”, ao ver sua plateia rir, e a faz rir ainda mais.

 — Bem... eles não têm esposas ainda, não é, Phill? — ele dá um tempo para a plateia diminuir a intensidade do riso e emenda. — Você já imaginou o que a sua esposa diria, se você tivesse que ficar confinado por todo esse tempo? — a plateia explode mais uma vez.

 — Creio que eu seria o próximo a escolher uma futura esposa, Peter. — a plateia ri e aplaude de pé, já que somos os últimos convidados de seu programa.

 — É isso ai! Estamos terminando mais um programa Peter Pergunta!  Não se esqueçam de se inscrever para tentar fisgar um bonitão milionário! Espero que tenham gostado, e até a semana que vem!

Peter começa a apertar nossas mãos em despedida, agradecendo a nossa participação, e nós sabemos que os créditos estão subindo, na tela do espectador, enquanto é tocada a música tema de seu programa, que ouvimos também no palco. 

É, sem dúvida, a parte mais cansativa do programa: duas semanas viajando o país inteiro, respondendo sempre as mesmas perguntas, para apresentadores e programas diferentes. Mas faz parte da divulgação e, com isso, recebemos muitas inscrições de mulheres solteiras, divorciadas e viúvas, se candidatando à vaga de futura esposa de celebridade.

Já recebemos sub-celebridades também, e deu muito certo. Mas as celebridades são nosso ponto de foco, afinal, eles sempre são alvos de interesseiras e têm medo de se relacionar com qualquer pessoa.

Nós selecionamos as candidatas depois de uma vasta pesquisa de campo: investigamos sobre suas vidas, seu passado, seu presente, sua paixão pelo nosso candidato a noivo, se fizeram alguma perseguição a ele ou qualquer outro famoso rico, ou rico sem fama... ou seja, uma ficha realmente completa, antes de colocá-la no palco, diante dos nossos caras, e elas sempre assinam um contrato de confidencialidade, ou nem participam da seleção. 

Depois das duas semanas de entrevistas em programas, estou prestes a entrevistar uma garota que parece não ter se apaixonado por ninguém em sua vida. Examino mais uma vez a ficha que o nosso investigador fez dela e continuo sem entender o motivo do diretor tê-la selecionado para a décima segunda, e última vaga, para conhecer o modelo John Aleksandar, mais conhecido como Alek.

Alek é descendente de sérvios por parte de pai e americanos por parte de mãe. Nascido numa cidade pequena no interior de Massachusetts, foi descoberto por um olheiro aos dezesseis anos, numa viagem de férias com os pais aos parques de Orlando, na Flórida, pois já era bem alto: 1,89 metros, com um porte promissor para as passarelas das grandes marcas de roupas masculinas; olhos azuis-acinzentados e cabelos castanhos, hoje Alek chama a atenção por seu corpo muito definidamente musculoso que arranca suspiros das mulheres de todas as idades e nações mundiais.

De posse de todas as informações sobre ele e sobre nossa candidata à última vaga, entro na sala, onde ela já me aguarda, com meu bloco de anotações eletrônico, aberto em uma ficha de eliminação-aprovação a ser preenchida. Coloco o bloco no modo escrever as respostas por comando de voz, assim não perco tempo e só vou lendo as perguntas da tela.

 — Boa tarde, Sharon. Meu nome é Sue e eu vou conduzir sua última entrevista para a entrada ou não do programa. Tudo bem?

 — Claro. — ela responde simpática.

 — Por que você se candidatou ao programa, se você não é apaixonada por Alek?

 — Nossa! Você já chegou intimidando, não é? — ela dá uma risadinha, sem graça. — Eu nunca me apaixonei por ninguém, e gostaria de ter a chance de me apaixonar pela pessoa certa, assim, logo de cara.

 — Então você tem medo de se relacionar com pessoas que possam, de alguma maneira, machucar seu coração? — essa pergunta foi selecionada pelo programa instalado no bloco eletrônico.

 — Tenho, sim. E muito!

 — Certo. O que você pensou quando soube que o candidato a noivo era o Alek?

 — Meu Deus! Esse gato? — rio baixinho com sua resposta.

 — E se não fosse ele, o que você faria com sua inscrição?

 — Daria prosseguimento.

 — Por quê?

 — Eu realmente não me importo com quem seja, se ele conseguir me conquistar no beijo, nas conversas. Sei que será ele a escolher os passeios que fará com as finalistas e, se eu conseguir chegar até lá, espero já ter me apaixonado por ele, pelo menos um pouquinho.

 — Um pouquinho quanto? — o programa me deu a opção de fazer uma pergunta complementar à minha escolha.

 — O suficiente para tentar dar uma chance a um romance com ele.

Faço mais algumas perguntas que o programa disponibiliza e encerro a entrevista. Envio o relatório para Chris, o diretor do programa “Quem me Beijou?”, e recebo a notificação de que eu também conduzirei a entrevista final de Alek em uma hora.

Aproveito meu tempo para comer uma fruta e descansar. No meu descanso, recebo um buquê de rosas-vermelhas de meu infiel e ludibriante marido. Estamos casados há três anos e essa é a terceira vez que descubro sua traição. Uma para cada ano e sempre perto do nosso aniversário de casamento. Nem sei porque ainda estou com ele, já que meu salário é bem maior que o dele! Eli é vendedor de carros usados, na loja de um amigo dele.

Leio mais um de seus bilhetes de desculpas, já sabendo o que está escrito, pois é sempre o mesmo texto.

“Não sei o que deu em mim... você tem que acreditar que foi só um deslize e que não voltará a acontecer! Eu te amo e você é a minha vida! Para sempre seu, Eli.”

 — Nossa! Até a disposição das palavras! — penso em voz alta.

 — Mais uma traição. Mais um buquê de rosas, com o mesmo pedido de desculpas... — Lisy comenta ao meu lado. — Você só tem vinte e quatro anos, Sue! Larga desse cara! Não é você quem vai perder.

Respiro fundo fechando os olhos. Lisy tem razão: eu preciso dar um jeito na minha vida e me desvencilhar desse cara. Ele não é confiável e eu me casei apaixonada. O que, claramente, já não estou mais.

 — Eu estou pensando nisso, Lisy. Sei que não posso ficar assim por muito mais tempo! — suspiro revirando os olhos para mim mesma. — Eu tenho toda uma vida pela frente.

 — É isso mesmo! Você é linda, Sue! Qualquer homem ficaria feliz em ter você na vida dele e você aí se privando de ter uma vida maravilhosa! Cai na real, por favor?

 — Estou caindo, amiga! — respondo a ela com um sorriso.

Olho para o meu relógio e saio da sala de descanso da emissora. Faltam cinco minutos para começar a entrevista com Alek. Tempo suficiente para chegar na sala onde vou conduzir sua entrevista final.