A Maldição de Caim

Titulo do capítulo: ⋆❈ ⋅•❂ Cena II ⋅⋆· Love & art ❂•⋅ ❈⋆

Autor: Elliot

✹⋆ Londres ·· Século XII ✹⋅

Olhares trocados não significavam nada — era o que Caim gostava de se lembrar enquanto andava entre os mortais, enquanto deslizava entre aquele

emaranhado de corpos que constantemente alternava suas formas de pensar, vestir, se portar.

— Ouvi que o filho mais novo do conde não deseja se casar — uma das senhoras dizia, baixo o suficiente para ser considerado um comentário educado e alto o suficiente para que quem quisesse — pudesse enfim ouvir — existem todos aqueles boatos, mas no fim das contas, não se pode afirmar nada, pode?

“Bobagem”, o ruivo pensou enquanto se recostava a parede de pedras escuras. Aquela senhora — assim como tantas outras — estava apenas esperando que a primeira alma, sem medo das consequências, replicasse um comentário maldoso para que ela enfim pudesse pôr os seus para fora.

— Ora, mas ele não esteve noivo da filha do marquês?

— Esteve? — Um sorriso maldoso surgia naqueles lábios rosados demais.

— Bom, foi o que ouvi dizer; até mesmo foi conversado sobre isso em um dos jantares-…

Os olhos de esmeralda não lapidada se fixaram no longe, nas portas que se abriam e davam espaço para que o objeto de tanto falatório — entrasse.

Cabelos na altura dos ombros, ondulados — castanhos. Olhos claros, pele bronzeada.

Louis — o filho do conde de Farrell —, um jovem apaixonado pela arte, com uma visão tão ampla para um futuro distante que o filho de Lilith pensava

que o destino o amava muito pôr o ter posto para nascer como homem; pois se Louis houvesse tido a desgraça de nascer como uma jovem daquela época — seria certamente tomada como uma bruxa ou uma louca, arrastada pela sarjeta e condenada, levando consigo o nome de sua família e título.

Louis se perdia entre as tintas e telas, entre uma visão de mundo que parecia irreal para aquelas pessoas — para aquele momento da humanidade —, e talvez fosse por Caim estar no inferno, por conhecer alguém, alguém que preferia não se recordar em dias como aqueles , que conseguia entender

perfeitamente o sentimento do jovem rapaz Farrell.

— Será que ele ao menos dançará uma música dessa vez? — Uma das jovens que recém havia realizado seu debute podia ser ouvida por todos ali.

Caim sorriu, um sorriso de canto cheio de desgosto.

— Oh, querida — uma mulher um tanto quanto mais velha murmurou — não tenha esperanças em vão — o leque abanando próximo ao rosto — o senhor Farrell não dançou nem mesmo uma única vez desde que foi apresentado a sociedade, boatos dizem que o mais próximo disso aconteceu durante o aniversário de sua irmã mais nova — quando gentilmente a guiou pelo salão até ser entregue a seu futuro noivo.

— Céus — uma segunda garota resmungou — e como ele planeja escolher sua esposa?

“Talvez ele não pretenda” — Caim pensou, mas seus lábios estavam selados, precisavam estar pelo bem de Louis e o seu próprio.

Afinal — uma troca de olhares era apenas uma troca de olhares e aquela não era a Grécia antiga —, mas tão rápido quanto isso surgiu em sua mente,

outra vez, os olhos de um turquesa profundo, encontraram os seus.

Olhares eram apenas olhares — repetiu e repetiu.

Um arquear surgiu nos lábios rosados.

“Não se esqueça do que aconteceu” a voz em sua mente repetia como uma amiga — ou quem sabe inimiga —, constante, incapaz de esquecer os cabelos negros e as estrelas de uma noite escura e gélida.

Desvencilhe-se.

Detenha-se.

Fuja e faça com que o que restou de seu coração permaneça intacto — repetia enquanto os cabelos ruivos caiam por seu rosto, enquanto seus pés

aceleravam os passos e o levava para fora, para longe daquele sorriso, daquela música que se tornava mais alta, das risadas constantes e dos comentários das mulheres.

Respiração ofegante, mãos fechadas em punhos — ficaria tudo bem desde que apenas observasse. Ficaria tudo bem desde que o jovem Louis fosse apenas um fantasma a ser observado como tantos outros que haviam vindo antes dele.

Um jovem sacerdote que foi friamente morto por sua família ao descobrirem seu amor por outro rapaz.

Uma mulher de ideias fortes e sorriso fácil — que foi queimada como bruxa em uma cruzada da igreja.

O pobre bardo que dançava e cantava em uma cidade pequena — assassinado pelo marido de uma das muitas mulheres com quem dormia.

Caim estava acostumado — encarou o céu noturno, o céu sem estrelas, com uma enorme lua cheia; estava tão gelado que uma fumaça saia de sua boca enquanto respirava.

Havia se acostumado a tudo aquilo, a humanidade e sua fragilidade.

Estava acostumado a apenas observar e jamais — intervir. Interagir.

Porque amar um mortal — era como desejar uma dor inigualável, avassaladora.

— Então é aqui que se esconde — uma voz sonora praticamente sussurrou, um tom risonho, calmo — todos os bailes, neles todos eu simplesmente o perco de vista, mas ao menos dessa vez…

A respiração de Caim parecia suspensa no ar, seus olhos fixos no céu.

— Por um momento — a voz continuou — pensei que o senhor de Laubert não simpatizava muito com minhas ideias e bom, com minha pessoa.

O rapaz de olhos esmeralda, se virou — corpo parecendo tenso enquanto encarava a expressão sorridente de Louis Farrell.

— Mas não é esse o caso, é, senhor Laubert?

A boca do ruivo se abriu, mas nem mesmo uma única palavra foi dita.

— O senhor estava me olhando em meu debute, estava lá quando minha irmã veio a sociedade e então, esteve em todos os bailes onde apareci — Louis não retirou a mão do ombro do ruivo, os dedos apertando gentilmente enquanto se aproximava de Caim — pensei que estava interessado na posição política de meu pai, mas mesmo quando ele o elogiou em público, você não se aproximou. Pensei então que estava interessado em minha doce irmã, mas quando houve toda a guerra pela sua mão, o senhor nem mesmo se pronunciou.

— Certamente não tenho interesse em sua irmã — Caim se ouviu dizendo — os olhos tremeluzindo na noite sem estrelas.

— Sim — Louis sorriu — me dei conta disso quando esteve em minha pequena exposição.

Os olhos verdes se arregalaram.

— Você… me notou-…

— Meu caro — o ser de olhos turquesa agora estava tão próximo, que Caim conseguiu sentir seu hálito próximo ao rosto — quando um homem ruivo, de tez delicada e olhos esmeralda o encara em meio a milhares de rostos comuns… é impossível de não se notar.

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